Quem se apaixona por gatos; e adota um gato proveniente do abandono ou maus tratos acaba reservando um tempinho para acompanhar os "sem número" de casos ( de todos os tipos ) de gatinhos abandonados e seus resgates.As campanhas de adoção, pelas redes sociais têm o grande privilégio de ter, em admiradores da causa, um grande apoio - ainda que seja na simples divulgação do trabalho dessas pessoas guerreiras.
Muitas pessoas ajudam mensalmente, eventualmente, esporadicamente...enfim...
A gente sempre escuta ou lê que, na primavera/verão, é enorme o número de gatinhos nascendo e sendo abandonados...muitas vezes recém-nascidos...com a mãe, sem a mãe...
Eu sou daquelas que sofre com esse tipo de notícia.
Sempre torci muito pelos finais felizes.
Eu sempre fiz o que estava ao alcance com relação aos gatos abandonados que cruzaram o meu caminho.
Levo comida, água...Dou vermífugo, antipulgas( muito embora a gente saiba que o melhor remédio é a adoção consciente), ofereço o meu carinho e já consegui lar seguro para um ou outro gato.Trabalho pequeno, quase inexistente, mas que, se cada um fizesse assim, do jeito que pode, já seríamos um batalhão.
Você nunca tem a exata noção do que é cuidar de filhotes órfãos até ter que cuidar de algum.
Eu, que nunca tive filhos humanos (porque sempre julguei, entre outras coisas, ser uma tarefa muito complexa) fui contemplada pela Mãe Natureza com a tarefa de ser MÃE DE GATO.
Pois eu vou te dizer uma coisinha que eu ouvi de um veterinário: " Não é tarefa para amadores" !
Bom...
Havia uma gata ( que batizei de Colette) que alimentei desde o dia em que a vi amamentando sua ninhada em cima de um telhado, numa rua próxima ao meu endereço.
Colette era arisca, defendia seus filhotes e não nos permitia aproximação. Mas eu levava a comida e água mesmo assim. Eu levava todas as noites.
Com o tempo, a Colette passou a confiar... Nossa relação ficou tão boa que ela passou a esperar todas as noites e, com o tempo, ela aprendeu o caminho de casa e, caso houvesse um atraso, ela vinha até a a porta esperar pela sua refeição.
Colette tinha uma meiguice singular.Acredite você ou não...ela tinha o costume de, antes de começar a comer, vir se enroscar ...e ronronava muito! Era como um ritual de agradecimento.Por mais que ela estivesse faminta, antes ela agradecia. Me emociono muito em lembrar disso.
No último momento, acolhi a Colette pra que ela tivesse seus bebês com um mínimo de conforto e decidi que , após o período de amamentação, todos entrariam para adoção.
Trouxe, então, a gravidinha pra garagem na madrugada do meu aniversário. Meus 40 anos.
Quando acomodei a Colette, percebi que ela já estava em vias de parir, devido uma secreção que havia em sua genitália.
Fiquei empolgada...meu "primeiro parto" e bem no dia do meu aniversário!!!Que alegria poder acolher essa gata tão amada!!!
Mas não foi bem assim que aconteceu.Colette pariu 3 gatinhos(machos) em um dia(sendo o de número 2 morto logo ao nascer por alguma complicação que minha inexperiência não permite explicar) e um quarto gatinho(fêmea) no segundo dia.Tudo bem, isso é perfeitamente aceitável.Mas a barriga dela não diminuiu e a levamos ao veterinário.Mas aconteceram várias coisas, a Colette teve que ser submetida a uma cirurgia longa e difícil que levou a um desfecho bem ruim desse meu "primeiro parto".
O que era pra ser uma história empolgante, virou um grande desafio para nós: Colette morreu, deixando três filhotes recém-nascidos , de olhos fechados, completamente dependentes.
E agora,né?
Como é bom ter amigos...graças a alguns amigos, o "mistério da vida" foi se desvendando bem na nossa frente...Recebemos muita ajuda.Ajuda de quem sabia, de quem não sabia, de quem queria ajudar simplesmente.Sem falar nos livros e artigos que li.Estávamos todos conectados na mesma rede.
Alguns disseram que não iriam conseguir passar da primeira semana.Mas a gente ia passando um dia de cada vez.Com muito cuidado.
Na prática, o que um gatinho de 2 ou 3 dias de vida precisa para sobreviver funciona mais ou menos como uma receitinha básica:
1.Calor (porque o gatinho só vai conseguir manter seu calor natural SOZINHO depois dos 20 ou 21 dias de vida);
2. Barriga cheia de leite ( e vc vai ter que
amamentá-lo com mamadeiras próprias para filhotinhos e leite especial sendo receita caseira ou industrializada)
3
.Barriga vazia de cocô e bexiga vazia de xixi ( para isso vc terá que providenciar gaze; algodão ou lencinho umedecido e água morninha, sempre, até que os gatinhos adquiram NATURALMENTE OU POR OBSERVAÇÃO o instinto de "eliminação" e, literalmente, aprendam a usar a caixinha de areia).
Basicamente isso.
O detalhe é que vc precisa estar atento praticamente 24h por dia.Bebês gatinhos de 90g /100g mamam a cada 2h e precisam estar aquecidos...Vc precisa ter, sempre à mão, uma forma de aquecê-los.Nós, aqui, utilizamos garrafas plásticas de 1/2 l com água quentinha dentro.Colocava essas garrafas dentro de uma bolsa para pets, bem acolchoada.Cobria com uma espécie de pelúcia e mais uma manta ou toalha.
Ganhamos de uma pessoa, uma almofada de sementes, que aquecia no forno e colocava juntinho deles.Às vezes o calor durava até 4h !!!
A grande dificuldade era alimentar esses pequenos seres.
Na primeira noite em que tive que alimentar os bebês , fui pega de surpresa.Eu havia, intuitivamente, comprado uma mamadeirinha para filhotes, pois imaginei que, convalescente da cirurgia, Colette teria alguma dificuldade em amamentar...Como havia leite de vaca aqui em casa, foi exatamente o que dei a eles(misturado a uma gema de ovo e uma colherinha de mel) durante a primeira noite.
Na manhã seguinte, comecei com leite em pó para filhotes de gatos.
Segui dando o leite artificial e tentando fazer o papel de mãe-gata, pra fazer com que eles evacuassem.
Meus 7 gatos foram super companheiros e dignos de todas as homenagens porque faziam silêncio e observavam com o maior respeito toda a batalha.
Aprendi que devemos pesar os gatos.Ganhei uma balança digital de um fabricante de alimentos para pet havia algum tempinho e essa balança era a companheira inseparável.
O gatinho tem que ganhar peso todo dia.Não pode ficar estagnado.Então fiquei controlando e comemorando cada grama, cada progresso.
A casa ficou em segundo plano e eu fiquei sem ver a "cara" da rua por um bom período.
O problema maior, com relação ao leite veio quando os bebês estavam para completar 2 semanas.
Constipação.Esse é o nome do monstro .
Foi muito ruim assistir a agonia dele.E ouvir o seu último grito antes de morrer de dor.Foram horas de muito sofrimento.
O pior é que os outros dois filhotes também estavam com o intestino preso...Creio que foi por causa do leite.
Eu já sabia que esse leite "ressecava" os intestinos...mas não tinha muita alternativa e fui tranquilizada quando busquei ajuda.Confiei que ia dar tudo certo.Infelizmente não deu tão certo assim.
Mas aqui eu abro um parêntese: Quando vc está cuidando de um filhote, a sua observação, às vezes, vale mais do que uma boa informação teórica.
Só vc sabe o que está acontecendo, de fato.
Eu lamento muito essa perda.Era um gato lindo, forte e tinha muito fôlego pra viver.
Isso aconteceu no 15º dia de vida deles.
Todos dizem que o gato é muito frágil até o 15º dia de vida.
Que ele começa a se fortalecer a partir daí.
Que se vc chegar até o 15º dia, dificilmente vc perde o gato órfão.
Mas eles estavam constipados...Além de todas as dificuldades de vc não ser um gato, ainda mais isso.
Não consegui substituir uma gata...Veja vc...que ironia da vida...
Levei os dois filhotes para uma consulta com um veterinário muito bem recomendado. Fomos muito bem recebidos e aprendi muito com ele.Sujeito, acima de tudo, muito solidário.
O Dr me ensinou a fazer enema.
Procedimento simples.Precisa de uma sonda uretral(de uso humano e à venda em casas de artigos hospitalares); uma seringa(pra poder injetar o produto na sonda e a sonda, por sua vez, no reto do gatinho) e um determinado remedinho para se fazer enema em crianças constipadas, que é o que vai servir de lubrificante para o reto e vai estimular a eliminação das fezes dos gatinhos(pode ser glicerina líquida e atenção: JAMAIS USE
"FLEET" EM GATOS).
Essa era minha tarefa: introduzir a sonda mais ou menos 1 cm no reto dos gatinhos e injetar 1 ml do lubrificante neles.
Em seguida, massageava bem as barriguinhas e depois estimulava a região perineal com algodãozinho úmido.
O Dr havia dito que eu deveria me livrar do leite artificial o quanto antes.Mesmo tendo trocado o leite que causou o tal transtorno por leite de cabra.
Uma grande amiga conversou com algumas pessoas experientes no assunto e recomendou que usasse o leite de cabra com um suplemento em gotas.
Eu estava ansiosa por descobrir o momento certo de começar o desmame deles.
Queria muito que eles ficassem independentes e, pra isso, teria que desmamá-los.
Eles começaram a ter dentinhos com umas 2 semanas.
Os dentes caninos cresceram depois de 21 dias e foi aí, mais ou menos que começamos a investir no desmame.
É incrível como depois da primeira semana de vida tudo começa a acontecer:
Com 7 dias eles começaram a abrir os olhos - mas só lá pelo 30º dia é que eles vão enxergar bem mesmo;
Com 2 semanas, os ouvidos externos do gatinho começam a se abrir e ele começa a escutar o mundo, aos poucos...já se coçam e começam a querer passear...
Com 3 semanas eles já têm um certo equilíbrio pra escalar e sair correndo...e já dispensam o calor artificial...Na verdade, isso vc vai percebendo...eles começam a fugir do calor.
O que antes era atrativo vai virando empecilho...e vc vai retirando as benditas garrafas pet/ bolsa de água quente(meu sonho de consumo era uma almofada térmica elétrica)aos poucos mesmo.
Com 21 dias de vida, o gatinho TEM QUE TOMAR A PRIMEIRA DOSE DE VERMÍFUGO.
E, claro, foram tomar vermífugo no consultório veterinário.Uma gentileza do Dr.
Com mais ou menos 3 semanas e meia, eles começam a retração das unhas e é mais ou menos nessa fase que os gatinhos aprendem a usar uma caixa de areia.
Eu os mudei de ambiente, pois já estavam saindo de dentro da bolsa e corriam risco de se machucarem.
Pus eles num outro quarto e continuei permitindo acesso dos outros gatos.
Agora mais do que nunca, pois precisava de instrutores eficientes para os bebês. Pus tudo o que um gato independente pode precisar num ambiente...para servir de estímulo mesmo.
O Gorki foi o gato que deu mais assessoria grátis.
La Goulue ficava esperando uma "rebarba" de qualquer coisa comestível...Assim como a Bijou, a gata do meu pai, que estava aqui, de férias, nessa fase.
Foi mais ou menos aos 27 - 28 dias que eu resolvi, depois de conversar com uma pessoa que viveu uma situação parecida, introduzir outro alimento.
Eu fazia uma
sopa para os nossos gatos que sempre foi disputada na minha Ronronaria.
Eu havia feito essa sopa para dar à Colette, no pós-cirúrgico.
Havia feito bem líquida...(
receita da sopa)
E, como Colette morreu, eu congelei a sopa pra mexer com esse assunto depois.
E não é que deu certo?
Descongelava uma porção por dia.
Batia bem no liquidificador e colocava na mamadeira(sempre oferecendo leite em seguida) e os bebês aceitaram muito bem!
Então se vc está pensando em desmamar algum gatinho órfão, a sopa é um bom começo.
Eu indico!!!
Eu tenho certeza que foi essa sopa que equilibrou os intestinos deles, pois foi depois de 4 dias que eles começaram a fazer cocô naturalmente.
Mais uma semana e já estavam enterrando o próprio cocô na caixinha de areia.
Que maravilha!!!
Fiquei feliz porque sabia que eles estavam vencendo essa batalha.
Comecei a apostar no alimento de transição...e comecei, também, a colocar alimento seco à disposição.
Os gatos adoraram essa ideia...
Chegou um momento que não dava mais para oferecer mamadeira, porque eles mordiam os bicos das mamadeiras até cortar.
Então nós pensamos como mãe-gata (acho que é por isso que elas desmamam seus filhotes...quem aguenta levar mordidas assim???) e aboli a mamadeira.
Mas continuei colocando leite num potinho...
Bem... posso dizer que o machinho teria ficado até hoje no alimento pastoso.Ele se recusava a mastigar.Eu ficava muito preocupada e não sossegava enquanto ele não estivesse alimentado.
Tinha mesmo muito medo de perdê-lo.
Mantive os dois no andar de cima da casa até o dia em que completaram 3 meses.
Tinha medo de perdê-los pela casa...porque, apesar de terem crescido muito(nasceram com 80g e 90g mais ou menos) ainda são pequenos...
Mas liberar "a casa" foi a melhor coisa a ser feita!O menino passou a se alimentar melhor e eu pude retomar a rotina.
Os gatos puderam retomar quase toda a rotina, à exceção de algumas áreas com rede de proteção, que ainda estão restritas para evitar pequenos acidentes com os filhotes, cujas cabeças - pequenas - ainda podem passar pela rede e se enroscar...
O que eu posso dizer que aprendi, com certeza, nisso tudo, é que é possível salvar gatinhos órfãos, sim.
Acho que o Dr tem razão quando diz que as pessoas deveriam saber fazer enema e alimentar gatinhos filhotes com sonda.
É incrível...eles têm o reflexo de engolir a sonda!!!
Vc coloca a pontinha na boca deles e eles vão engolindo.
Basta ter bom senso e medir a altura das costelinhas deles...que é o tanto de sonda que eles vão engolir.
Com a sonda, vc garante 6 horas de barriguinha cheia. E tem um certo tempo para descansar.
É o mesmo método do enema com a sonda de uretra humana e a seringa.
Vc põe o leite na seringa e vai, lentamente, mandando o leitinho para a barriguinha do filhote.
Mas se vc tem receios, peça a um veterinário bacana para te mostrar.
Eu não fiz, porque na ocasião em que descobri esse método, já estava alimentando os pequenos a cada 3 ou 4 horas(sim! à medida que o tempo passa, vc vai dando intervalos maiores nas mamadas, porque eles conseguem mamar mais) e não havia necessidade disso.
Mas o Dr nos mostrou como fazer.
Aprendi muito sobre filhotes.
Ouvi muitos bons comentários sobre os acertos.
Eles tomaram vermífugo, complexo vitamínico e estão prestes a tomar vacina.
Quanto à experiência emocional...Bem...
É muito difícil falar a respeito.
Tudo aconteceu numa data muito simbólica...só para começar...
Tudo aconteceu de uma maneira muito particular para mim.
Já tinha 7 gatos aqui.
Um limite mais que acima do que o "juízo" permite.
Não se tratam, simplesmente, de dois gatinhos que foram tirados da rua para buscar um lar.
São verdadeiramente como filhos.
E eu, como metade de mãe felina, gostaria de continuar "lambendo a minha cria"; mesmo que isso pareça insano.
Sou mãe de gato, com orgulho.
E, se me permite uma última observação: muito mais do que esses dois filhotes sortudos, sortuda sou eu...essa sim, é a grande lição que a Mãe Natureza me deu, no ano em que completo 40 anos, com a sua sabedoria incontestável.